quinta-feira, 14 de janeiro de 2010

Os autores e as suas obras, segundo Schopenhauer (1788-1860)

As obras são a quintessência de um espírito; daí elas serem incomparavelmente mais ricas que o contato pessoal, mesmo quando se trata de um grande espírito, as obras acabam por substituí-lo na essência - e, inclusive, o superam largamente e o deixam para trás. Mesmo os escritos de um espírito medíocre podem ser instrutivos, dignos de leitura e agradáveis, precisamente porque são sua quintessência, o resultado, o fruto de todos os seus pensamentos e estudos; - enquanto a convivência com ele não consegue nos satisfazer. Daí que possamos ler livros de pessoas cuja convivência não nos agradaria e, assim, uma alta cultura espiritual nos leva pouco a pouco a encontrar entretenimento quase exclusivamente com livros e não mais com as pessoas.

In Schopenhauer, Arthur. Sobre livros e leitura / Über lesen und bücher. Trad. de Philippe Humblé e Walter Carlos Costa. Porto Alegre (RS): Paraula, 1993.

Creio que todos os que já publicaram livros compreendem bem o que afirma o filósofo alemão. Na preparação de uma obra busca-se sempre excluir o que é secundário ou imperfeito, em uma luta para alcançar o melhor. Nesse sentido, a obra será sempre superior ao autor, porque ela reflete o melhor que ele tem a oferecer naquele momento. Já a vida não dá pra recortar. Mas não chegaríamos por isso à mesma conclusão de Schopenchauer. Esta a proposta de reflexão ou discussão que lhe propomos, rara leitora. Participe. 

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Brasileiros entre 15 e 64 anos: só 25% são plenamente alfabetizados!

O título poderia ser: caiu o índice de ‘analfabetos funcionais’, já que pesquisa recente mostrou que houve redução do número de brasileiros nessa condição, de 34%, em 2007, para 28%, em 2008. Destes, 9% não conseguem ler qualquer escrito, os demais têm o chamado ‘alfabetismo rudimentar’.


Já o percentual dos que dominam apenas o ‘alfabetismo básico’ é de 47%. Somados aos brasileiros considerados ‘analfabetos funcionais’ chega-se aos 75% da população que certamente não conseguem ler um livro e compreender um texto complexo.


Os resultados do Indicador Nacional de Analfabetismo Funcional (Inaf), elaborado pelo Instituto Paulo Montenegro, alertam para o quanto é necessário investir em educação e em políticas públicas para redução das desigualdades sociais (rompendo com a política de concentração de renda praticada pelos diferentes governos há décadas) para que o povo brasileiro tenha mais oportunidades de melhorar sua qualidade de vida e de participar da riqueza material e simbólica do país.


Para conhecer saber mais sobre a pesquisa e todos os resultados acesse a página:
 http://www.ipm.org.br/ipmb_pagina.php?mpg=4.03.00.00.00&ver=por

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

É hora de renovar práticas, projetos e sonhos

Inauguração da árvore de Natal flutuante na Lagoa Rodrigo de Freitas, Rio de Janeiro, 2009. Foto de JLV.
Os marcos cronológicos despertam reavaliações e novos objetivos. É hora de agradecer aos companheiros e companheiras de jornadas, pelas pequenas ou grandes conquistas, aos nossos raros e raras leitoras, que tiveram a paciência de aguentar este longo interregno, à família e entes queridos que suportaram a falta de tempo e atenção. Este que se encerra foi um ano vitorioso e difícil, onde o que foi alcançado nos trouxe gratificações imensas e criou novos compromissos, que exigem grande dedicação neste 2010. Que possamos continuar, cada um com seus desafios e utopias, a cumprir metas e a nos encontrar, pessoalmente ou de forma virtual.
Meus votos, rara leitora, são por muitas alegrias nesta passagem, realizações, sonhos, expansão e recolhimento, e uma vida muito enriquecida em 2010 para você, seus entes queridos e para todos nós.

Acervo histórico da Francisco Alves já está na rede





Está na rede o novo sítio virtual do Lihed - Núcleo de Pesquisa sobre Livro e História Editorial no Brasil, da Universidade Federal Fluminense (UFF), criado em 2003. Ele inclui as páginas do I e do II Seminário Brasileiro Livro e História Editorial, realizados em 2004 e 2009, com textos e fotos acessíveis. Além disso, oferece o arquivo do acervo histórico da livraria Francisco Alves (1854-1954), com muitas imagens das capas e folhas de rosto das edições, além de detalhadas descrições bibliográficas. É o embrião do futuro Centro de Memória Editorial Brasileira. Clique www.uff.br/lihed e faça uma viagem pelo seu conteúdo.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Cultura e mercado editorial - Seminário internacional na ECA-USP




Seminário Internacional
Cultura e Mercado editorial (sec. XIX-XXI)

Editores e livreiros estrangeiros na Paris do século XIX
Profa. Diana Cooper-Richet
(Centre d´histoire culturelle des sociétés contemporaines – UVSQ – França)

Estratégias dos grupos de comunicação no alvorecer do século XXI
Prof. Jean-Yves Mollier
(Centre d´histoire culturelle des sociétés contemporaines – UVSQ – França)

Mediador: Prof. Aníbal Bragança (UFF-RJ)
Coordenação: Profa. Marisa Midori Deaecto (USP-SP)


Data: 10 de dezembro de 2009 (Quinta-Feira)
Horário: 19h30

Local: Auditório Freitas Nobre (CJE-ECA)
Av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443 - bl. A
Cidade Universitária - São Paulo - SP

Realização:
Escola de Comunicações e Artes – Depto. de Jornalismo e Editoração (USP)
NELE (Núcleo de Estudos do Livro e da Edição – ECA/USP)
Edusp – ComArte – ComArte Jr.

Para os estudiosos ou agentes do mundo dos livros é um encontro imperdível, raro leitor. Se está em São Paulo ou para lá se poderá dirigir, não perca. O ingresso é gratuito, mas as vagas são limitadas. As conferências terão tradução para nosso idioma.
Mais informações: tel: (11) 3091.4112

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Para o mesmo encontro na Ideal, um novo convite


A Editora Edusp colocou em seu site http://www.edusp.com.br/listaconvite.asp#20091107 o convite acima, criado por Cinzia de Araújo e Fernando Ogushi, que estendemos a você, raro leitor. Até lá.

Se não puder comparecer e desejar adquirir o livro diretamente à Edusp, acesse:
http://www.edusp.com.br/detlivro.asp?ID=411519

domingo, 1 de novembro de 2009

De volta à atividade com uma boa notícia


Rara e raro leitor,
após tanto tempo sem trazer-lhes notícias, retorno ao convívio com o convite para um encontro no tradicional Calçadão da Cultura da Livraria Ideal, em Niterói, no próximo sábado, dia 7, quando serão apresentadas as novas edições dos livros Livraria Ideal, do cordel à bibliofilia, em caprichada edição da Edusp e Com-Arte, e do clássico do mestre Israel Pedrosa, Da cor à cor inexistente, em sua 10ª edição, comemorativa, agora a cargo da excelente editora do Senac.
Estará também disponível o último livro de ensaios do mestre da cor, que inclui um belo texto sobre Monteiro Lobato e a questão modernista.
Será uma oportunidade para encontros e reencontros entre amigos em torno de livros.
Quem sabe nos veremos lá?

Para saber mais sobre o livro Livraria Ideal, acesse a entrevista concedida à Rádio Usp, no programa Sala de Leitura, apresentado por Jorge Vasconcelos; está apresentada em dois programas de 5 minutos:

1a. parte (5'):http://www.radio.usp.br/programa.php?id=80&edicao=091020
2a. parte (5'):http://www.radio.usp.br/programa.php?id=80&edicao=091022

E aproveite para colocar o programa entre seus favoritos.

quinta-feira, 9 de abril de 2009

Ainda o II Lihed - Participe Últimas vagas


Raro leitor, se quiser conhecer mais do II Lihed acesse www.uff.br/lihed. Ainda restam algumas vagas e você pode ser um dos privilegiados que participarão deste encontro acadêmico especial.
Convido-o ainda a ler a entrevista que concedi a Jorge Vasconcellos, repórter do portal da Associação Brasileira de Editoras Universitárias (ABEU) clicando aqui:
http://www.abeu.org.br/noticias.php?id_noticia=177




terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

II Seminário Lihed




É com satisfação que comunico a você, raro leitor, que está tudo sendo preparado com muito carinho para que o II Seminário Brasileiro Livro e História Editorial (II Lihed) seja um encontro memorável para todos os que estudam, pesquisam e trabalham no campo do livro, da leitura e da história editorial.

A abertura será na Biblioteca Nacional, do Rio de Janeiro, com o "Diálogo Brasil-França: Livros e leituras: teorias e práticas", no dia 11 de maio; a seguir, nos dias 12 e 13 teremos o "Colóquio Internacional: Arquivos, Memória Editorial e História da Vida Literária" na Academia Brasileira de Letras, onde também será feita a abertura do II Lihed com a conferência de Jean-Yves Mollier, da Université de Versailles-Saint-Quentin en Yvelines - UVSQ (França), "A história do livro e da edição, observatório privilegiado do universo mental dos homens dos séculos XVIII a XX". Os dias seguintes terão sua programação desenvolvida na Universidade Federal Fluminense, em Niterói.

Muitos convidados nacionais já confirmaram a presença, assim como os convidados franceses: Roger Chartier, Jean-François Botrel, Diana Cooper-Richet, Michel Melot, Frédéric Barbier e André Vauchez, e também Manuela D. Domingos, da BN-Lisboa.

O site do Seminário www.uff.br/lihed estará acessível, a partir de amanhã, 11 de fevereiro, com as informações gerais, inclusive sobre inscrições. Participe!

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Sandra Medeiros: Célula tipográfica e epitáfio para Tide Hellmeister


Sobre a Célula Tipográfica:

Há 5 anos, pesquisadores, tipógrafos e estudantes, reunidos na Célula Tipográfica, movimentam Vitória e o Centro de Artes da Universidade Federal do Espírito Santo.(...)

A denominação escolhida, Célula Tipográfica, levou em consideração a concepção do núcleo como uma pequena unidade estrutural e funcional reunindo pessoas com os mesmos ideais de prática e pesquisa, principalmente em torno da menor unidade da palavra, a letra, na sua forma caligráfica, sólida (os tipos móveis) e digital.

A partir da prática caligráfica e com vistas à futura construção de fontes, a Célula tem promovido workshops de caligrafia ocidental e oriental, a produção de cartões-postais e o desenvolvimento de projetos maiores como as coleções Tipografia de Bolso e Amostra Grátis. (...)

Leia o texto completo de Sandra Medeiros sobre a Célula Tipográfica nos arquivos do e-grupo Cultura Letrada:
http://groups.google.com/group/cultura-letrada/files?hl=pt-BR

*

O velho Tide (o jornalismo perde um mestre)

Fiquei sabendo, tardiamente, que o artista gráfico Tide Hellmeister não resistiu a um enfisema e a uma cirurgia no coração e deixou a nossa convivência no último dia 31 [de dezembro]. Não é mais notícia, mas o fato tem alcance, afeta o jornalismo, as artes gráficas, o design, a arte: ficou um espaço que não se preenche. Perdemos um profissional dos mais sérios, criativos, realizadores. Não são poucos os projetos pioneiros de Tide e aqueles que conhecem a sua história sabem disso: de autor do importante Técnica Tipográfica à coluna Significado do significado (no Diário Popular) Tide fez de tudo e um pouco mais. Querido e admirado no meio editorial e gráfico, ele foi um dos criadores da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, a notória ECA-USP; da Cásper Líbero; da Escola Superior de Propaganda e Marketing. (...)

Leia o texto completo do belo epitáfio escrito por Sandra Medeiros nos arquivos do e-grupo Cultura Letrada:
http://groups.google.com/group/cultura-letrada/files?hl=pt-BR

**

Raro leitor, em tempo de preparativos do II Seminário Brasileiro Livro e História Editorial, que se realizará de 11 a 15 de maio próximo, recebi dois textos da professora e designer Sandra Medeiros, da Universidade Federal do Espírito Santos, querida amiga, que me permitiu oferecê-los também a você. Espero que os aproveite.

Conheça mais de Sandra Medeiros em LetraG http://es.letrag.com/blogosfera.php?id=82

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Cristovam Buarque para a Direção Geral da Unesco

Rara leitora, há uma iniciativa em movimento, nascida na sociedade civil, de apoio à indicação, pelo governo brasileiro, do Senador Cristovam Buarque como candidato na eleição de 2009 para a Direção Geral da Unesco.

Acreditamos que o nosso senador terá, como poucos, o perfil ideal para essa importante missão de ajudar a transformar o mundo pela educação para todos.

Se você deseja apoiar a indicação, acesse e assine a petição que está na página da Associação de Produtores Teatrais Independentes (APTI):

http://www.apti.org.br/unesco.html

E vamos manter a esperança de poder, com nossas ações simples, ajudar a construir um mundo melhor.

terça-feira, 30 de dezembro de 2008

Um bom Ano Novo!

Alba
Geir Campos

Não faz mal que amanheça devagar,
as flores não têm pressa nem os frutos:
sabem que a vagareza dos minutos
adoça mais o outono por chegar.
Portanto não faz mal que devagar
o dia vença a noite em seus redutos
de leste – o que nos cabe é ter enxutos
os olhos e a intenção de madrugar.


in A profissão do poeta & Carta aos livreiros do Brasil, org. de Aníbal Bragança e Maria Lizete dos Santos. Niterói: Imprensa Oficial do Estado do Rio de Janeiro, 2001, p. 71.

Rara leitora, raro leitor, que a passagem para o Ano Novo seja de alegrias e paz, de amor e fraternidade. Que tenhamos a serenidade e a firmeza necessárias para construir uma vida cada vez melhor para nós e para todos que pudermos alcançar com nossos gestos, palavras e pensamentos. Feliz 2009!

sábado, 20 de dezembro de 2008

Feliz Natal!


Foram apressadamente e acharam Maria e José, e a criança deitada na manjedoura.

E, vendo-o, divulgaram o que se lhes havia dito a respeito deste menino.

Todos os que ouviram se admiraram das cousas referidas pelos pastores.

Maria, porém, guardava todas as palavras, meditando-as no coração.

Voltaram então os pastores glorificando e louvando a Deus por tudo o que tinham ouvido e visto, como lhes fora anunciado.

O Evangelho segundo Lucas, 2, 16-20, in A Bíblia Sagrada. Trad. de João Ferreira de Almeida. Brasília: Sociedade Bíblica do Brasil, 1969.

A você, raro, a você, rara leitora, os votos de um Natal Feliz, tendo presente, ainda hoje, o sentido do nascimento daqu’Ele menino.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

Um livro na sua árvore de Natal, de Dalcídio Jurandir

- Que presente vai me dar, este Natal? Uma cesta, um perfume, aquele colar que vimos juntos na vitrina?
- Não. Um livro.
- Mas livro?!
Entraram na livraria, o rapaz pediu o Pequeno Príncipe, de Exupéry e deu a ela:
- Pra começo de conversa e de Natal. Principie.
- Príncipe? Príncipe o que?
- A ler, menina! Comece pelo Príncipe.

Certo é que perfume, colar, a meia, tão habituais ao Natal, não temem concorrência de livro. Nem as grandes cestas que parecem cargas lotando a sala de jantar próspera ou as mais discretas, por mais baratas, que vão para o subúrbio, velha encomenda pensada há meses. As coisas, como presentes, ainda só valem pelo brilho, quantidade e preço.

Embora caro e nunca necessário quanto o arroz e o feijão, ou mesmo a castanha, o livro custa menos que a gravata e dura mais que o perfume e o sabonete.

Passarão os Natais e aquela moça há de encontrar na sua casa, relido ou esquecido, mas constante, o livrinho comprado de circunstância que lhe falará sempre de um Príncipe e de suas sutis aventuras. O rapaz poupou o bolso praticando um bom-gosto, atreveu-se a entrar na livraria ao invés de entrar na perfumaria. E isso há dez anos não era assim.


Não era hábito de Natal fazer presente de livro, coitado do livro ali na montra cinzenta, entre o tédio do caixeiro e a solidariedade poeirenta dos outros livros, seus companheiros de solidão e abandono.

Agora o desamparado é confiado a uma embalagem, e tome papel colorido e tome laço de fita, aparece na vitrina, num ar festivo, como caixa de presente. Vem aos poucos ganhando seu lugar de Natal e Ano Bom.


Os novos tempos sopraram o velho pó das montras e sacodem o embaraço de quem quer dar um presente: Que tal um livro? Barato, fino, lisonjeia quem dá e quem recebe. Vamos ao livro.

A eletrônica sugere um presente

Se menino quer brinquedo, o técnico espera aquele livro que vive namorando, o Eletrônica Aplicada e convém que seu amigo se lembre disso e apareça com o presente. E há professores e estudantes que desejariam ganhar, neste Natal, aquele Evolução da Física, de Einstein e Infeld, que custa apenas setecentos cruzeiros.


É possível que a estudante de faculdade de filosofia vacile entre a pulseira e o A Origem da Terra que a preocupa nas suas aulas. Aqui esse moço parou diante da vitrina, lendo A Mecânica do Cérebro e sua curiosidade é compreensível, estuda psicologia e confia que o amigo lhe apareça em pleno Natal com o desejado volume. E não custa experimentar mandar de presente a um técnico de carros aquele Manual do Volkswagem.

A ilustração como presente de festa

Ilustrar-se é uma antiga aspiração popular, ilustrar-se naquele sentido de ler um almanaque, ler curiosidades, folhear um dicionário. Como presente de Natal, a ilustração reserva muito atrativo. Por exemplo, O Livro da Natureza, o Deuses, Túmulos e Sábios, as fartas enciclopédias, Milagres da Novocaína e o persuasivo Vença a Alergia a quatrocentos cruzeiros. E para maior resistência da ilustração, bom presente é a História da Liberdade no Brasil, de Viriato Correia.


Podemos ir aos preços mais altos, como a Enciclopédia de Arte, da editora Martins, a sete mil cruzeiros, as coleções da Cultrix - Histórias e Paisagens do Brasil - vários volumes, a seis e quinhentos ou a História das Invenções, e pode-se chegar a este: Sexo: perguntas e respostas, Guia para um casamento feliz ou mandar embrulhar, como presente, o Amor e Capitalismo, de Cláudio de Araújo Lima.

Pendure a ficção na sua árvore


Se tem árvore, não hesite, tome o rumo da livraria e veja o desfile da ficção brasileira um pouco ansiosa de virar presente, um pouco ainda envergonhada, mas que diabo! Não faz mal sair num embrulho lindo, ser pendurada na árvore ou discretamente entregue ao amigo:
Convém ler a ficção nacional, senhores que gostam de dar presentes de festas, convém! Por exemplo, aqui temos o segundo volume de Marques Rebelo, A Mudança, e aí você encontra o Rio em excelente prosa; mande embrulhar também o Maria de Cada Porto, de Moacir Lopes, não esqueça Primeiras Estórias, de Guimarães Rosa, O Vento do Amanhecer em Macambira, de José Condé, Matéria de Memória, de Carlos Heitor Cony, o Corpo Vivo, de Adonias Filho, Serras Azuis, de Geraldo França de Lima, o Ganga-Zumba, de João Felício dos Santos, o Arquipélago, de Érico Veríssimo, a coleção Graciliano Ramos numa verdadeira embalagem de Natal, todo o José Lins do Rego.

Entre a quantidade dos presentes nunca será demais A Comédia Humana, de Balzac, da editora Globo, ou a coleção Dostoievski, da José Olympio, o Guerra e Paz, de Tolstoi ou Grandes Esperanças, de Dickens. E será bom incluir no roteiro uma visita a Machado de Assis, seus livros devem estar em toda estante; e fazemos questão de lembrar que há um romance indispensável para presente: o Triste Fim de Policarpo Quaresma, do carioca Lima Barreto.


Por outro lado, os que gostam da velha aventura podem ainda ler o Alexandre Dumas em Os Três Mosqueteiros e O Colar da Rainha e a coluna maciça dos romances policiais – mas sempre livro.

A hora da poesia

Em matéria de poesia é seguir os bons poetas e a Aguilar pode dar de presente o Fernando Pessoa em volume muito digno. Mas não esquecer, leitora da grama em Del Castilho, defronte do conjunto residencial, que bom presente é também As Primaveras, de Casimiro de Abreu, ou as Espumas Flutuantes, de Castro Alves, ou, então, o Terceira Feira, de João Cabral de Melo Neto.

Não fica aí a sugestão, porque outros poetas estão ao nosso alcance, neste Natal: Lição de Coisas, de Carlos Drummond de Andrade, Para Viver um Grande Amor, de Vinicius de Moraes, O País do Não Chove, de Homero Homem e o Violão de Rua. Estão à sua espera, que é comprar, levar e o presente valeu por toda vida.

Miudeza também é presente

Os mais modestos não desejam os livros mais ricos ou os mais sábios e sim aqueles, por exemplo, da coleção “Como Se Faz...", "Como Se Vence”, onde é fácil encontrar para um presentinho despretensioso, o Arte de Fazer Amigos, o Aprenda a Conversar, Como emagrecer comendo e tudo a preço camarada.

Informações úteis, como presente, é uma boa sugestão de Natal e Ano Bom; este, por exemplo, Da Tabela Price ou Conheça seus Direitos, além do Aprenda a Nadar Corretamente e mande a seu amigo um “Manual de Judô”, sempre é livro.

Para um distante amigo da roça, não será bom mandar de presente o Lições Práticas de Avicultura? A um que se empenha no esoterismo, mande esse volume aqui, solene, por nome Cabala.

Os livros sérios

Todo livro é sério e creio que nada mais sério do que um livro de poesia. Mas aqui os sérios são os livros de fisionomia grave como, por exemplo, o Reflexões sobre a História, de Burckhardt, o Pré-Revolução Brasileira, de Celso Furtado, A Inflação Brasileira, de 1820 a 1958, a Coleção Saber, com mais de cincoenta volumes, o Princípios de Planejamento Econômico, o Manual de Economia Política, da Editorial Vitória, o Formação Histórica do Brasil, de Nelson Werneck Sodré, os livros da coleção Brasiliana, o Dicionário do Folclore Brasileiro, de Luiz da Câmara Cascudo, o Cristianismo Hoje, da editora Universitária, a preços que variam de trezentos e setecentos.

Cabe incluir, pela atualidade, o Política Externa Independente, de Santiago Dantas. Um Hatha-Yoga é um presente de Natal a amigo que cultiva essa transcendente matéria. E em meio a tamanha seriedade de livros, não esquecer que o Natal e Ano Bom reclamam livros de cozinha, este, por exemplo, Prenda Seu Marido...Cozinhando.

Agora, noutra escala, a da crítica, temos dois presentes de significação: A Glória de César e o Punhal de Brutus, de Álvaro Lins, e o Laboratório Poético de Cassiano Ricardo, de Osvaldino Marques.

“Homenzinho na Ventania"

A Editora do Autor lançou uma nova coleção de presentes: A Mulher do Vizinho, de Fernando Sabino, A Bolsa e a Vida, de Carlos Drummond de Andrade, o O Retrato na Gaveta, de Oto Lara Rezende e Homenzinho na Ventania, de Paulo Mendes Campos.

Outro presente de festas é o Banho de Cheiro, de Eneida, os “Cadernos do Povo Brasileiro”, da Civilização Brasileira, o álbum de Portinari, a coleção Les plus beaux: insetos, borboletas, cães, o El Greco, o Picasso, o Caribe.

Para um político, bom presente é Vida de Virgílio de Melo Franco, de Carolina Nabuco. Temos depois, ou antes, os livros sobre futebol: Copa do Mundo, de Mário Filho e Drama dos Bi-Campeões, de Armando Nogueira e Araújo Neto.

E do assunto Pelé, podemos chegar ao assunto teatro e apanhar da Aguilar o Bodas de Sangue, de Federico Garcia Lorca, chegando, ainda, ao Pagador de Promessas e A Invasão, de Dias Gomes. E a um amigo curioso da África, mande África - as raízes da revolta, e sobre Fidel, o ainda atual A Verdade sobre Cuba.

Um político pode receber para ensinamento a toda hora, o História das Lutas Sociais no Brasil, de Everardo Dias, e a outro que queira ter um bom santo na sua estante não é mau lhe oferecer As Confissões de Santo Agostinho.

O mundo maravilhoso gira em torno de Monteiro Lobato


No Brasil, a história para criança continua a girar em torno de Monteiro Lobato. Os meninos continuam a ver no mestre o avô contador de histórias. Por isso, chovem os livros de Monteiro Lobato nos sapatos, na noite de Natal, e com ele os outros livros, os outros autores, o cortejo dos bichos e fadas e tudo que é o faz-de-conta e o encantado e o que é ainda bom de contar às crianças.

Aqui, o presente é mais numeroso e vale a pena. Preferível este Na Região dos Peixes Fosforescentes ou a Coleção para Jovens, da editora Brasiliense, que o revolverzinho de bandido...

Mas não só menino necessita de livro. Gente grande também. E agora Natal e Ano Bom é a ocasião de fazer do livro um bom, e até bem barato, entre coisas tão caras, presentes de festas.

Nota: Além da revisão, foi feita uma atualização ortográfica do texto original.

Este texto, rara leitora, foi publicado no jornal Última Hora, na década de 1960. Foi resgatado por José Roberto Freire Pereira, filho de Dalcídio Jurandir, que mantém o sítio virtual http://www.dalcidiojurandir.com.br/ em homenagem à obra imortal de seu pai, considerado um dos grandes romancistas brasileiros, especialmente por sua obra sobre a vida na região amazônica, com foco especial na Ilha de Marajó.

A ocasião é propícia, como nos escreveu José Roberto, para divulgar esta página de Dalcídio, pois pode nos lembrar do livro como um ótimo presente de Natal. Mais que isso, o texto nos remete a um tempo em que ler livros era prática bem valorizada, ao menos em parcela significativa da sociedade brasileira.

Vivíamos um tempo de esperanças renovadas de construção de um mundo melhor, de uma sociedade brasileira mais justa, em que o conhecimento poderia, pela tomada de consciência social, operar transformações e possibilitar reformas.

As chamadas reformas de base, a pré-revolução brasileira, dos tempos de Jango Goulart, dando continuidade à construção do nacional iniciada por Getúlio Vargas, retomada por Juscelino Kubitscheck e mesmo por Jânio Quadros em sua meteórica e tresloucada presidência.

Os livros apontados por Dalcídio Jurandir em sua crônica são um bom retrato das práticas sociais de leitura do período, vistas por um intelectual de esquerda não sectário. Apontam os grandes sucessos e as então novidades da literatura brasileira, lembram os clássicos da literatura universal e ensaios relevantes, obras de ciências sociais e políticas, livros práticos e de divulgação científica, sem esquecer a literatura infantil e juvenil. Um belo retrato de época.

Será que hoje aquilo que era novidade, na ótica de Jurandir, dar livros de presente, novamente é prática que se perdeu? Você, rara leitora, irá presentear com livros neste Natal?

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

Uma Ilha de Leitura, de Felipe Matos

O livro Uma Ilha de leitura: notas para uma história de Florianópolis através de suas livrarias, livreiros e livros (1830-1950), de FelipeMatos, editado pela Editora da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) www.editora.ufsc.br , é, segundo o autor, uma “introdução ao tema da circulação da cultura letrada na ilha de Santa Catarina”.

Na apresentação, a professora Maria Teresa Santos Cunha, da UESC, afirma que “é obra de extrema sutileza e exigência, onde o senso crítico nunca se dissociou da ternura e onde a liberdade permanente não dispensou jamais os rigores e as riquezas do diálogo histórico”. Diz ainda que esta obra “foi construída lenta e continuamente em um longo perambular do seu autor por variados arquivos, bibliotecas, leituras, conversas”, sendo “uma criteriosa pesquisa que apresenta uma cartografia possível para uma história editorial da cidade de Florianópolis (a partir de Desterro), mapeando suas tipografias, livrarias, livreiros e livros”.

Leia a íntegra do texto de Maria Teresa Santos Cunha, “De tipografias, livrarias e livros: viagens por mundos e fundos”, acessando os Arquivos do e-grupo Cultura Letrada:
http://groups.google.com/group/cultura-letrada

O lançamento, em Florianópolis (SC), ocorrerá nesta quinta-feira, dia 15 de dezembro, a partir de 19h, na Patropi, Av. Rio Branco, 583 – Centro.

Mais informações: Tel. (48) 3222-4644.

Recebi e estendo a você, raro leitor, a notícia deste lançamento, que me deixou muito contente. Torcia por essa publicação desde que conheci o seu belo texto, de leitura prazerosa. Estou certo que o jovem historiador Felipe Matos dá uma importante contribuição à história cultural de Santa Catarina e à história do livro no Brasil.


Envio daqui meus parabéns a Felipe. Peço a você, raro leitor, que, se puder estar presente, lhe dê um abraço por mim.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Périplo, de Sávio Soares de Sousa

Abro o livro de Homero e me surpreendo,
anônimo, entre heróis de iluminura,
eu, caipira inocente, de mistura
com gregos e troianos, combatendo.

Incomoda-me o peso da armadura.
Nem mesmo sei se agrido ou me defendo.
E devo confessar: só não me rendo
porque desperto ao cabo da leitura.

Fecho o volume. Saio do aeroporto,
fatigado de errâncias, quase morto.
Ulisses, eu? Meu lema é amor e paz.

Retorno ao lar e, em pouco, estou refeito:
Penélope me aguarda, no seu leito,
e essa história de guerra - nunca mais!

Niterói, 28/11/2008.

Inédito do poeta niteroiense, a sair em seu próximo livro, A penúltipla guerra de Tróia (Poesia Reunida), pela Traço&Photo, previsto para 2009. Fiquemos atentos, pois a poesia de Sávio é sempre boa de saborear.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

Contos do Velho Nipon na Primavera dos Livros

Luís Antônio Pimentel autografa Contos do Velho Nipon. Foto de Augusto Erthal.

Masanori Ninomiya, o ilustrador da 3a. edição de Contos do Velho Nipon, autografa. Foto de Augusto Erthal.



A leitora conversa com Pimentel enquanto aguardo o seu autógrafo no belo Palácio do Catete.
Ao fundo, Ricardo Hallais fotografa. Foto de Augusto Erthal.

Professora Sonia Regina Longhi Ninomiya, Luís Antônio Pimentel, Masanori Augusto Longhi Ninomiya, o ilustrador, Luiz Augusto Erthal, o editor, e Augusto Erthal, autor do projeto gráfico da bela edição de Contos do Velho Nipon. Foto de Ricardo Hallais.


Alguns registros do lançamento do livro Contos do Velho Nipon, de Luís Antônio Pimentel, realizado no dia 29/11/2008, durante a Primavera dos Livros, nos jardins do Museu da República, antigo Palácio do Catete, no Rio de Janeiro.

A 3a. edição do livro foi uma iniciativa do editor fluminense Luiz Augusto Erhtal, da Nitpress (tel. 55-21-2618-2972), e contou com a colaboração do jovem ilustrador Masanori Ninomiya, que expressou, magnificamente, em traços contemporâneos, a magia dos contos tradicionais da cultura japonesa e de seus personagens eternos.
O projeto gráfico, harmônico e muito bem urdido por Augusto Erthal, inclui a tradução para o japonês, em ideogramas, feita pela professora Nícia Tanaka, do título do livro e dos seus contos: Momo Tarô ou o Filho do Pêssego, O Velho e os Demônios, O Jovem Pescador, O Tito-tico de Língua Cortada, O Ressuscitador de Árvores, o Macaco e os Caranguejos, A Montanha de Katch-Katch, A Aranha Fantasma, A Vingança da Raposinha, O Guerreiro e o Anãozinho, O Machado de Ouro, Kintaro.
O belo volume, cartonado, de 86 páginas, conta ainda com os peritextos "Histórias de ontem, de hoje, e de sempre", de Sonia Regina Longui Ninomiya, "De uma Antologia Telúrica", de R. S. Kahlmeyer-Mertens, "Luís Antônio Pimentel, um Narrador", de Aníbal Bragança, o "Prefácio à Primeira Edição", de Mello Mourão, as "Notas do Editor" e "Dados biobliográficos da Luís Antônio Pimentel", e o registro do "Reconhecimento do Japão ao escritor fluminense".
É imperativo afirmar: Contos do Velho Nipon é uma das opções mais sugestivas para presentear, inclusive neste Natal, crianças, jovens e adultos, nipo-brasileiros ou não, pela sabedoria da tradição japonesa e pelo saboroso texto de Luís Antônio Pimentel, encerrados em belo volume.
PS: Luís Antônio Pimentel estará autografando Contos do Velho Nipon na Livraria Ideal, em Niterói - RJ (Rua Visc. de Itaboraí, 222, Centro - tel. 55-21-2620-7361), no dia 20/12/08, sábado, de 10 às 13h. Se puder, não perca!

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

Vestibular para cursos de graduação à distância em universidades públicas do Rio de Janeiro

Recebi, raro leitor, e repasso para eventuais interessados estas informações que me parecem relevantes:

As inscrições para o Vestibular Cederj 2009/1 foram prorrogadas até o dia 30 de novembro.

São 4.011 vagas para os cursos de graduação à distância em diferentes áreas.

O consórcio Cederj é uma parceria entre o Governo do Estado do Rio de Janeiro, através da Secretaria de Ciência e Tecnologia, e as universidades públicas presentes no estado (UENF, UERJ, UFF, UFRJ, UFRRJ e UNIRIO).

São destinados aos professores das redes públicas de ensino estadual ou municipais 20% das vagas dos cursos de Licenciatura oferecidos pela UFF, UFRJ e UNIRIO. Dos cursos oferecidos pela UENF, são destinados a esses professores 20% das vagas remanescentes das cotas.

Para mais informações: www.cederj.edu.br e telefone (21) 2568.1226.
Para inscrever-se, só até 30 de novembro: www.cederj.edu.br/vestibular

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Contos do Velho Nipon na Primavera dos Livros do Rio de Janeiro



Estãos convidados, rara leitora, raro leitor, a conhecer Luís Antônio Pimentel, um grande narrador, uma grande figura humana, com 96 anos e muita vitalidade, autor de Contos do Velho Nipon, cuja 3a. edição, estará sendo lançada pela NitPress, na Primavera dos Livros, no Palácio do Catete, Rio de Janeiro, conforme o convite acima, sábado, dia 29, de 12 às 14 h.


Jornalista, memorialista, poeta, com uma trajetória de vida admirável, Pimentel viveu de 1937 a 1942 no Japão, como um dos dois primeiros estudantes brasileiros que para lá foram com bolsas do governo japonês. Ia ficar apenas dois anos, mas, encantado com a cultura japonesa, acabou morando lá por cinco, trabalhando na Rádio Tokio e no consulado brasileiro, além de viajar e conviver com o povo, as gueixas e os grandes escritores nipônicos.


Festejado, seu livro, Namida no Kito, foi o primeiro livro de poeta brasileiro a ser editado no Japão, em 1940, em edição bilíngüe.

Nesse mesmo ano, saía no Brasil, pela Pongetti, a primeira edição do Contos do Velho Nipon, uma recolha que fez Pimentel do universo da tradição oral que ouviu ser contado, no convívio com as famílias japonesas, especialmente do interior. A 2a. edição faz parte do volume 2 de suas Obras Reunidas, organizadas por este blogueiro, editadas pela Niterói Livros, em 2004.

Luís Antônio Pimentel tem as características do narrador apontadas por Walter Benjamin, unindo o viajante ao que permanece em seu lugar. Formado em uma família de contadores que teve em seu tio, Figueiredo Pimentel, autor de Contos da Carochinha, um dos marcos da formação da literatura infantil brasileira, sua atenção acurada sempre esteve voltado para o universo da cultura popular. Memória privilegiada fez dele um apaixonado pela tradição oral.

Seus trabalhos sobre o folclore brasileiro e os Contos do Velho Nipon, nos dizem que estamos diante de um dos últimos narradores excepcionais da cultura brasileira.

Leia o texto, deste blogueiro, "Luís Antônio Pimentel, um narrador", inserto na nova edição de Contos do Velho Nipon, que está sendo lançada em comemoração aos 100 anos da imigração japonesa no Brasil.

Acesse: Luís Antônio Pimentel, Vida e Obra:
http://groups.google.com/group/luis-antonio-pimentel/files?hl=pt-BR

Para quem está no Rio de Janeiro, Niterói ou arredores, uma oportunidade imperdível.

PS: Leia na íntegra o livro Histórias da Avozinha, de Figueiredo Pimentel, na edição da Biblioteca Nacional Digital, disponível também nos Arquivos do E-Grupo Luís Antônio Pimentel, Vida e Obra:

http://groups.google.com/group/luis-antonio-pimentel


domingo, 16 de novembro de 2008

Jean-Paul Sartre, As Palavras: [Como aprendi a ler]

Foto - BBC: http://www.bbc.co.uk/portuguese/especial/149_sartre/



(...)
Comecei minha vida como hei de acabá-la, sem dúvida: no meio de livros. No gabinete de meu avô, havia-os por toda parte; era proibido espaná-los, exceto uma vez por ano antes do reinício das aulas em outubro. Eu ainda não sabia ler e já reverenciava essas pedras erigidas: em pé ou inclinadas, apertadas como tijolos nas prateleiras da biblioteca ou nobremente espacejadas em aléias de menires, eu sentia que a prosperidade de nossa família dependia delas. Elas se pareciam todas; eu folgava num minúsculo santuário, circundado de monumentos atarracados, antigos, que me haviam visto nascer, que me veriam morrer e cuja permanência me garantia um futuro tão calmo como o passado. Eu os tocava às escondidas para honrar minhas mãos com sua poeira, mas não sabia bem o que fazer com eles e assistia todos os dias a cerimônias cujo sentido me escapava: meu avô – tão canhestro, habitualmente, que minha mãe lhe abotoava as luvas – manejava esses objetos culturais com destreza de oficiante. Eu o vi milhares de vezes levantar-se com ar ausente, contornar a mesa, atravessar o aposento com duas pernadas, apanhar um volume sem hesitar, sem se dar o tempo de escolher, folheá-lo, enquanto voltava à poltrona, com um movimento combinado do polegar e do índice, e depois, tão logo sentado, abri-lo com um golpe seco “na página certa”, fazendo-o estalar como um sapato. (...)

Meu avô nunca soubera fazer contas: pródigo por desleixo, generoso por ostentação, acabou por cair, muito mais tarde, nessa doença dos octogenários, que é a avareza, efeito da impotência e do medo de morrer. Naquela época, ela se prenunciava apenas numa estranha desconfiança: quando recebia, por ordem postal, o montante de seus direitos autorais, erguia os braços para o céu gritando que lhe estavam cortando a garganta, ou então entrava no aposento de minha avó e declarava sombriamente: “Meu editor me assalta como numa floresta”. Eu descobria, estupefato, a exploração do homem pelo homem. Sem essa abominação, felizmente circunscrita, o mundo, no entanto, apresentar-se-ia bem-feito: os patrões davam segundo suas capacidades aos operários segundo seus méritos. Por que era preciso que os editores, esses vampiros, o descompusessem, bebendo o sangue de meu pobre avô? Meu respeito cresceu por aquele santo homem cujo devotamento não obtinha recompensa: fui preparado desde cedo a tratar o magistério como um sacerdócio e a literatura como uma paixão.

Eu ainda não sabia ler, mas já era bastante esnobe para exigir os meus livros. Meu avô foi ao patife de seu editor e conseguiu de presente Os Contos do poeta Maurice Bouchor, narrativas extraídas do folclore e adaptadas ao gosto da infância por um homem que conservava, dizia ele, olhos de criança. Eu quis começar na mesma hora as cerimônias de apropriação. Peguei os dois volumezinhos, cheirei-os, apalpei-os, abri-os negligentemente na “página certa”, fazendo-os estalar. Debalde: eu não tinha a sensação de possuí-los. Tentei sem maior êxito tratá-los como bonecas, acalentá-los, beijá-los, surrá-los. Quase em lágrimas, acabei por depô-los sobre os joelhos de minha mãe. Ela levantou os olhos de seu trabalho: “O que queres que eu te leia, querido? As Fadas?” Perguntei, incrédulo: “As Fadas estão aí dentro?” A história me era familiar: minha mãe contava-a com freqüência, quando me levava, interrompendo-se para me friccionar com água-de-colônia, para apanhar debaixo da banheira o sabão que lhe escorregara das mãos, e eu ouvia distraidamente o relato bem conhecido; (...)

Ao cabo de um instante, compreendi: era o livro que falava. Dele saíam frases que me causavam medo: eram verdadeiras centopéias, formigavam de sílabas e letras, estiravam seus ditongos, faziam vibrar as consoantes duplas: cantantes, nasais, entrecortadas de pausas e suspiros, ricas em palavras desconhecidas, encantavam-se por si próprias e com seus meandros, sem se preocupar comigo: às vezes desapareciam antes que eu pudesse compreendê-las, outras vezes eu compreendia de antemão e elas continuavam a rolar nobremente para o seu fim sem me conceder a graça de uma vírgula.

Seguramente, o discurso não me era destinado. Quanto à história, endomingara-se: o lenhador, a lenhadora e suas filhas, a fada, todas essas criaturinhas, nossos semelhantes, tinham adquirido majestade, falava-se de seus farrapos com magnificência; as palavras largavam a sua cor sobre as coisas, transformando as ações em ritos e os acontecimentos em cerimônias.

Alguém se pôs a fazer perguntas: o editor de meu avô, especializado na publicação de obras escolares, não perdia ocasião de exercitar a jovem inteligência de seus leitores. Pareceu-me que uma criança era interrogada: no lugar do lenhador, o que faria: Qual das duas irmãs preferia? Por quê? Aprovava o castigo de Babette? Mas essa criança era absolutamente eu, e fiquei com medo de responder. Respondi, no entanto: minha débil voz perdeu-se e senti tornar-me outro. Anne-Marie, também, era outra, com seu ar de cega superlúcida; parecia-me que eu era filho de todas as mães, que ela era a mãe de todos os filhos. Quando parou de ler, retomei-lhe vivamente os livros e saí com eles debaixo do braço sem dizer-lhe obrigado.

Com o tempo senti prazer naquele deflagrador que me arrancava de mim mesmo: Maurice Bouchor se debruçava sobre a infância com a solicitude universal que os chefes de seção dedicam aos clientes dos grandes magazines; isso me lisonjeava. Aos relatos improvisados passei a preferir os relatos pré-fabricados; tornei-me sensível à sucessão rigorosa das palavras: a cada leitura voltavam, sempre as mesmas e na mesma ordem, eu as esperava. (...)

Apossei-me de um livro intitulado Tribulações de um Chinês na China [de Júlio Verne] e o transportei para um quarto de despejo; aí, empoleirado sobre uma cama de armar, fiz de conta que estava lendo: seguia com os olhos as linhas negras sem saltar uma única e me contava uma história em voz alta, tomando o cuidado de pronunciar todas as sílabas.

Surpreenderam-me – ou melhor, fiz com que me surpreendessem –, gritaram admirados e decidiram que era tempo de me ensinar o alfabeto. Fui zeloso como um catecúmeno: ia a ponto de dar a mim mesmo aulas particulares: eu montava na minha cama de armar com o Sem Família de Hector Malot, que conhecia de cor e, em parte recitando, em parte decifrando, percorri-lhe todas as páginas, uma após outra: quando a última foi virada, eu sabia ler.
(...)


Jean-Paul Sartre. As palavras. Tradução de J. Guinsburg. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1984, 6ª. edição, p. 30-36.

A iniciação na cultura letrada de Sartre, um dos escritores franceses e filósofos mais importantes do século XX, está narrada detalhadamente em sua obra As Palavras [Les mots], publicada em 1964, mesmo ano em que recusa o Prêmio Nobel. Ele teve o privilégio de nascer em casa de leitores, com um avô escritor, o que lhe despertou precocemente o desejo de ler e o fez ter consciência da relação conflituosa (pouco rara) entre autores e editores.

Podemos pensar que as experiências de leitura são importantes para a formação de futuros escritores, como neste e no texto de Fernando Sabino, o autor imortal de Encontro Marcado, que, permita-me confessar, rara leitora, foi um dos livros marcantes na trajetória deste leitor lacunar.

E você, raro leitor, como se iniciou nas letras?

Para saber mais sobre Jean-Paul Sartre, inicie com:
http://pt.wikipedia.org/wiki/Jean-Paul_Sartre