sábado, 24 de maio de 2008

Mais uma nota muito triste: faleceu Robero Freire, autor de Cléo e Daniel

Fui procurar, rara leitora, quando li, consternado, a notícia da morte de Roberto Freire, o meu exemplar de Cléo e Daniel. Queria retomar do texto alguma das emoções profundas que tive ao ler esse belo e triste livro. Encontrei o Coiote, cuja dedicatória me fez retornar aos anos 1970-1980, quando estivemos próximos: “Pro Aníbal, amigo e companheiro de minhas viagens, mais esta que tem jeito de ‘point of no return'. E o abração amigo do ... Niterói, 27/8/86”. Creio que ele aludia ao mergulho no romance, pois que, depois do Cléo e Daniel - um grande sucesso na edição Brasiliense, lembro da capa que eu mais gostava, preta com uma margarida num canto - se dedicou a ensaios e artigos que seriam as bases da somaterapia, a qual criou, segundo penso, a partir de Wilhelm Reich, da gestalt e do anarquismo.

Era, especialmente, um artista, múltiplo. Mas também um médico psicoterapeuta. Com sua coragem, sensibilidade e generosidade fez lançamentos, palestras e workshops na Pasárgada, na Sala Manuel Bandeira, em Niterói, e lá criou um grupo, o qual acompanhou e fez crescer, anarquicamente. Fui beneficiário, direta e indiretamente, desse belo trabalho.

Roberto Freire deixou uma forte presença em muitas áreas e em inúmeras pessoas. Além de discípulos, uma obra de transformação, talvez deslocada num mundo de hoje, onde interioridade e crítica não são cultivadas, a não ser por poucos.

Se não leu, rara leitora, tem mais um motivo de alegria por cultivar a leitura. Busque num sebo um dos livros de Roberto. E viaje com ele nas suas loucuras e iluminações. Sempre chegaremos dessa viagem menos duros, menos certos e mais ricos.

Roberto Freire morreu ontem, sexta-feira, dia 23, com 81 anos, em S. Paulo.

Como epígrafe do livro Coiote, Roberto Freire inseriu esta “mensagem”:


Poetas de amanhã
Walt Whitman
(de Folhas de Relva, tradução de Geir Campos)

Poetas de amanhã: arautos, músicos
cantores de amanhã!
Não é dia de eu me justificar
e dizer ao que vim;
mas vocês, de uma nova geração,
atlética, telúrica, nativa,
maior que qualquer outra conhecida antes
– levantem-se: pois têm de me justificar!

Eu faço apenas escrever
uma ou duas palavras
indicando o futuro!
faço tocar a roda para a frente
apenas um momento
a volto para a sombra
correndo.

Eu sou um homem que, vagando
a esmo, sem de todo parar,
casualmente passa a vista por vocês
e logo desvia o rosto,
deixando assim por conta de vocês
conceituá-lo e prová-lo,
a esperar de vocês
as coisas mais importantes.

Pergunto, raro leitor, quem serão esses poetas, hoje? Certamente estão por aí... onde?

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