
O Brasil até ao feliz dia 13 de maio de 1808 não conhecia o que era tipografia; foi necessário que a brilhante face do Príncipe Regente Nosso Senhor, bem como o refulgente sol, viesse vivificar este país, não só quanto à sua agricultura, comércio e indústria, mas também quanto às artes, e ciências, dissipando as trevas da ignorância, cujas negras, e medonhas nuvens cobriam todo o Brasil, e interceptavam as luzes da sabedoria. Assim, por decreto datado deste mesmo dia dos seus felizes anos, Sua Alteza Real foi servido mandar que se estabelecesse nesta Corte a Impressão Régia, para nela se imprimirem exclusivamente toda a legislação, e papéis diplomáticos, que emanarem de qualquer repartição do real serviço, e também todas, e quaisquer obras, concedendo a faculdade aos seus administradores para admitirem aprendizes de compositor, impressor, batedor, abridor, e demais ofícios que lhe sejam pertencentes. Este máximo benefício, que Sua Alteza Real outorgou ao Rio de Janeiro, é bem de esperar que se comunique à Bahia, e também às capitais das principais províncias do Brasil, visto o sistema liberal que o mesmo augusto senhor tem adotado a favor dos seus vassalos desta parte dos seus domínios, e que se imprimam na América Portuguesa obras muito interessantes, que, ou já compostas, jazem na poeira do esquecimento, e do desprezo, ou que para o futuro se hajam de compor, facilitados os meios de se darem à luz pelo prelo.
In Luiz Gonçalves dos Santos (Padre Perereca). Memórias para servir à História do Reino do Brasil, S. Paulo: Edusp; Belo Horizonte: Itatiaia, 1981 [1825], tomo I, p. 207.
Hoje, rara leitora, completam-se dois séculos da criação da primeira tipografia permanente e definitiva no Brasil, no dia do aniversário do Príncipe Regente D. João, criada pelo decreto acima reproduzido.
[Ver em A tipografia no Rio de Janeiro, de Paulo Berger, Rio de Janeiro, 1984.]
O fato mereceu registro entusiástico e justo do cronista da corte, o Padre Perereca.
Hoje nosso país alcançou maturidade em sua indústria editorial, que produz quantitativamente volume considerável de exemplares de livros, especialmente, escolares. Entretanto, talvez em decorrência da baixíssima escolaridade média do cidadão brasileiro e da ignominiosa desigualdade de renda que coloca nas margens da miséria a maior parte da população brasileira, para que haja uma pequena ilha de privilegiados que se destacam entre os mais ricos do mundo, o Brasil não é, lamentavelmente, um país de leitores. Ainda o será?
O que acha, rara leitora?