Suspenso, o trabalho; pelo chão, esparsas, as ferramentas. O artífice sonda distantes mundos factíveis. Na destra, o compasso imóvel. A sinistra sustém o peso de milênios. Sentado ele está (há quanto?) e o cão ressona a seus pés.
Alado e imóvel, absorto. A matéria o rodeia, prenhe de possibilidades, clamando, convocando. O artífice sonha, todavia. O tempo escorre, o sol nasce ou se põe? Quem saberá?
Na cidade, ao longe, faz-se o comércio; há uma algaravia sem fim, os homens chegam e se vão mares a fora. E o artífice sonha. Seu pupilo estuda e aguarda o momento. Tudo está por fazer, por terminar. Mas não há pressa alguma, embora o sino possa sonar a qualquer momento, incontornável.
O lume, ao fundo, não se apaga. A tenaz pode esperar, o lenho pode esperar – não temos já aquela perfeição que repousa redondamente aos pés do artífice? Não temos já as faces lavradas e incorruptíveis de um poliedro pesando o peso do planeta?
E o artífice sonha. Enquanto durar o mundo ele estará sonhando.
O arco no horizonte longínquo (que o artífice não vê) parece selar essa certeza.
Novembro de 2007
Hoje, rara leitora, temos a alegria de oferecer a você este texto do poeta e marceneiro Henrique Chaudon, inspirado na célebre gravura (em cobre) Melancolia, de Albrecht Dürer (1471-1528).
Melancolia, de 1514, já inspirou pensadores como Walter Benjamin.
O poeta Chaudon, que celebra os 30 anos de lançamento de seu primeiro livro Confissões a Baco, criou um texto original e belo, que divulgou inicialmente em seu blog A Terceira Gaveta http://aterceiragaveta.blogspot.com . Vamos revisitá-lo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário